sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Entrevista com Alziro Zarur – Editor executivo da TV Anhanguera

“A informação deve ser encarada como uma necessidade básica”

Aos 49 anos, Alziro Zarur comemora uma década como editor executivo da TV Anhanguera, departamento de telejornalismo da Organização Jaime Câmara. Em entrevista aos repórteres Aline Mil, Lyvia Lemos e Rodrigo Vilela da Agência de Notícias da Universidade Federal de Goiás, o jornalista conta como foi a sua trajetória no jornalismo, começando com apenas dois anos de faculdade no Diário da Manhã, passando pelo rádio até chegar na televisão.

Como o senhor começou a atuar no jornalismo?
Zarur: Eu morava na Cidade de Goiás e sempre gostei muito de escrever e ler jornal; o dinheirinho que sobrava eu comprava na banca pra ler. No meu terceiro ano de ginásio, eu disse: “Acho que vou trabalhar nesse jornal aqui, vou fazer jornalismo”. E realmente deu certo. Mudei-me pra Goiânia, passei no vestibular da UFG na primeira tentativa e, quando eu estava no segundo ano, em 1980, surgiu um jornal novo em Goiânia: o Diário da Manhã. Um jornal com uma proposta de circulação nacional, que trouxe grandes jornalistas de todo o país, inclusive os principais nomes daqui, que trabalhavam no “O Popular”. Eu pensei: “Vou dar um jeito de entrar nisso”. Cheguei sozinho lá e eles estavam montando a equipe. Conversei com o editor-chefe e ele me deu uma pauta pra eu fazer dentro de tantos minutos, com um texto de 20 linhas e um título com duas pernas mais ou menos iguais. Eu fiz, ele gostou e me chamou pra trabalhar. Eu não tinha experiência nenhuma e, logo que voltei das férias em Goiás, comecei a trabalhar.
O Diário da Manhã foi uma grande escola naquela época, porque era uma proposta grandiosa, um sonho maluco do Batista Custódio de um jornal em Goiás adquirir circulação nacional, disputar com jornais de todo o país. Lá eu trabalhei com grandes nomes da imprensa brasileira como Washington Novaes, Aloízo Bionde e Marco Antônio Coelho. E mais um detalhe: o jornal trazia jornalistas de revistas e jornais consolidados pra dar palestras pra gente. Às vezes chegava um sábado, uma sexta-feira, e a gente tinha uma palestra na redação.

De que maneira o senhor passou a trabalhar na televisão?
Zarur: Bom, o sonho do Batista durou muito pouco, porque o mercado goiano não sustenta um jornal da magnitude que ele idealizava. Então, logo o Diário da Manhã entrou em dificuldades financeiras, o pessoal foi saindo devagar e ele fechou. A direção abriu um jornal provisório, até enquanto eles não conseguiam na justiça voltar com o Diário, mas, naquela altura, os grandes nomes já haviam ido embora. Mesmo alguns goianos já tinham voltado para seus jornais e foi naquela reformulação da equipe que eu fui aproveitado como sub-editor do jornal, uma responsabilidade enorme pra quem tinha apenas dois anos de faculdade. Fiquei um tempo trabalhando sem receber, de vez em quando fazíamos um vale, até que eu e mais sete pessoas resolvemos abandonar o jornal. Fomos pra um boteco tomar uma cerveja e aliviar a cabeça, porque a gente trabalhava demais, eu mesmo saía do jornal duas, três horas da manhã todos os dias.
Meus colegas foram trabalhar em outras áreas, rádio principalmente, e eu fui convidado para fazer notícia numa rádio sem experiência nenhuma nesse tipo de veículo. Na época, a rádio universitária não funcionava direito, então não tinha contato direto com isso. Eu redigia pequenas notas pra preencher o noticiário da emissora, passei pela Rádio Jornal e Rádio Clube. Uma dessas rádios, que é a Executiva hoje, foi comprada pela Organização Jaime Câmara e eu fiquei novamente desempregado. Um dia, enquanto eu redigia um noticiário, o Jackson Abrão me ligou e disse: “Olha, nós estamos precisando de um produtor aqui”. (Risos) Aquele vozeirão, eu nem o conhecia. Vim trabalhar aqui como produtor executivo, isso já faz 20 anos. Aí eu passei de produtor executivo, pra coordenador de reportagem, depois chefe de reportagem e, em 1995, na reformulação que houve ampliando a redação com uma nova proposta de telejornalismo, eu fui aproveitado como editor executivo, que é uma espécie de chefe de redação. É onde estou até hoje, 10 anos já.

Qual foi a grande dificuldade que o senhor enfrentou quando começou a trabalhar e até mesmo quando decidiu ser jornalista?
Zarur: Dificuldade mesmo eu acho que não tive, acho que a gente tem é que saber se adaptar ao meio Eu gostava de informações na área de política, economia e futebol. Mas, quando fui fazer o teste no Diário da Manhã e me perguntaram em qual área eu queria fazer o teste, já veio na minha mente: “Bom, a área de política já tem grandes experientes, a economia também, então ‘tô fora’, vou para o esporte!” Tenho certeza que eu não seria aproveitado nas duas outras áreas, por causa dos nomes já definidos. Aí eu fiz a matéria no esporte e o editor adorou, mesmo sem nenhuma experiência. O que me ajudou foi a leitura diária do jornal impresso.
Agora, dificuldades maiores vivo até hoje, porque a grande notícia pega a gente sempre de surpresa, você não está com a estrutura esperando alguma coisa acontecer. Você tem que deslocar uma equipe de algum lugar pra atender aquilo. Mas, por outro lado, é o que mais me motiva. Sempre falo para os meus colegas que eu vou encerrar minha carreira como se eu estivesse começando; o dia que eu vou feliz pra casa é quando essa redação ferve, pega fogo. O dia que eu acho ruim é aquele que não tem nada de novo acontecendo, que você fica tentando segurar daqui e dali. Redação morna pra mim é ruim, eu gosto é de redação quente. A maior dificuldade pra se adaptar à profissão é saber brigar contra o tempo, é adaptar a prática do jornalismo ao seu estilo de vida, porque uma coisa é você acompanhar o noticiário quando você não tem compromisso de produzi-lo; outra é quando você está envolvido naquilo. Eu não me sinto bem quando saio à noite sem ver pelo menos um telejornal. Eu fico sempre pensando que alguma coisa boa pode estar acontecendo no país que eu não esteja sabendo. Quando isso acontece, no dia seguinte eu espero o noticiário com uma certa insegurança, pensando se saiu alguma coisa que eu não tenha visto, que a gente não repercutiu em nível local. O jornalista que eu considero ideal é aquele que não consegue se desligar do noticiário. Não é que a gente vai levar essa coisa pra família, mas é sempre pensar no que pode ter acontecido. Não é uma obsessão, é uma responsabilidade. É preciso ter o jornalismo no sangue, realmente gostar da informação.

Quando você chegou em Goiânia, você sentia que o mercado da imprensa era um campo aberto? Em que contexto a imprensa goiana se encontrava quando você começou a trabalhar?
Zarur: Eu vim pra Goiânia sem informação de mercado de trabalho, não tinha a mínima noção do que era, só fui saber mesmo quando entrei nele. Nem quando eu estava na faculdade eu tinha essa noção disso, a não ser quando o Paulo Béringues, que trabalhava aqui na Jaime Câmara, foi dar uma palestra pra gente sobre como estava o mercado. Mas, primeiro, vamos falar de estrutura. Quando eu comecei no Diário da Manhã, a estrutura era muito boa, a gente tinha carro por conta, fotógrafo todos os dias, uma redação grande. O Diário da Manhã inaugurou a redação contínua, porque antes era tudo compartimentado, cada editoria tinha sua sala. O DM colocou todo mundo junto, era uma festa. (Risos) Quando eu fui trabalhar no rádio, chegava final de semana eu estava trabalhando, por exemplo, sozinho ali num prédio que não tinha mais ninguém, nem um guarda. Só me cabia fazer um texto e vinha um motorista lá do estúdio buscar a notícia; que por sinal eu achava muito ruim fazer. Transformar um fato importante em três linhas era um trabalho muito ruim pra mim. Quando eu vim pra TV, a estrutura também era ruim, porque embora o espaço noticioso aqui fosse menor, havia na TV Anhanguera apenas um produtor de notícias de manhã e um à tarde pautando seis repórteres. É muito pouco, mas até melhor do que por onde eu havia passado. Hoje nós podemos considerar que temos uma boa estrutura. Naquela época, fazer uma matéria ao vivo era um acontecimento. Você tinha que mobilizar o mundo e só entrava ao vivo aquele assunto que tinha que entrar. A gente mobilizava a estrutura três, quatro horas antes do fato e ficava torcendo aqui pra dar tudo certo. O dia que a gente conseguia fazer um ao vivo, era motivo de comemoração, era o fato do dia em Goiânia o “vivo” da TV Anhanguera. E hoje é rotina, é normal.
Acho que hoje o mercado de trabalho está muito mais disputado, muito mais saturado, embora existam muito mais vagas. Os profissionais que estão procurando o mercado de trabalho na área da imprensa estão em número muito maior, porque as faculdades aumentaram. Acho que o bom profissional vai ter sempre um lugar pra trabalhar.

Todas as matérias que vocês fazem aqui na TV Anhanguera têm que passar pela avaliação da rede nacional?
Zarur: Não, a gente oferece pra Globo só aquilo que nós achamos que vale como notícia de rede. Hoje nós temos uma estrutura boa, com um núcleo que produz especialmente pra rede. Temos uma editora, que coordena esse núcleo, repórteres especificados, um produtor que trabalha pautando pra rede e um editor de vt exclusivo pra isso.

Quando o senhor falava para os seus amigos que trabalhava na rádio, no Diário da Manhã, como era a aceitação do seu trabalho?
Zarur: Sempre há um retorno do trabalho. Mesmo quando eu estava no Diário da Manhã, que ainda tinha uma circulação pequena. Sempre encontrava uma pessoa que dizia que tinha lido a minha matéria. Agora, há muito pouco retorno crítico. Normalmente, o público leitor, o telespectador ou até mesmo as pesquisas que a gente faz, não são muito críticos. É uma dificuldade que a gente tem. Quando queremos analisar determinado programa, determinado telejornal, nós encomendamos uma pesquisa qualitativa, voltada realmente para uma avaliação crítica. A pesquisa do dia a dia, não funciona, porque se você for fazer, as pessoas são muito generosas. O jornalismo é uma porta aberta, é o profissional junto a comunidade e as pessoas vêem isso com bons olhos. É para onde elas apelam quando falta algo melhor.

O senhor acha então que o Jornalismo é uma segunda opção?
Zarur: É. O jornalismo é tido como quarto poder, mas eu acho que depende muito do momento. Em crise política, o jornalismo assume, como aconteceu no Impeachment do Fernando Collor, o lugar de muitas instituições democráticas porque elas não funcionavam como deveriam e ele acabava por noticiar e opinar por elas.

O senhor acha que agora as pessoas lêem mais, assistem mais os telejornais do que quando o senhor começou?
Zarur: Existem pesquisas sobre isso. Há uns 6 meses, tive um estudo mais aprofundado nesse assunto. Proporcionalmente, o público leitor de jornal impresso tem diminuído aqui e no mundo, o público de televisão tem crescido e continua crescendo. Os estudos feitos na Universidade de Navarra, na Espanha, prevêem o crescimento de 2% do público de televisão aberta pelo menos nos próximos 10 anos. O público de rádio tem diminuído, a não ser no esporte e em algumas coisas especializadas. Os leitores de revista também têm diminuído, mas menos que os de jornal. Mas, por outro lado, surgiu essa nova mídia, a Internet, que tem conquistado o público e tem um potencial de crescimento muito grande. Cada vez mais, as pessoas têm menos tempo e procuram meios mais práticos de acessar a notícia. Muitos fazem uma previsão negativa para o jornal impresso no futuro, não se sabe até onde ele vai chegar e não há resposta definida sobre isso, mas a tendência é cair. Isso é um estudo feito, eu mesmo não tenho um pensamento próprio sobre isso, a única coisa que eu fiz foi acessar essas pesquisas e assistir um curso em São Paulo.

O senhor acha que as pessoas lêem pouco, têm pouco acesso à informação?
Zarur: Acho que o público brasileiro lê muito pouco. O europeu, o argentino, lê bem mais do que nós, lá os jornais vendem muito mais, embora, como aqui, tenha-se registrado queda nas vendas. Se você imaginar que a população cresce e o jornal cai, então a proporção é maior ainda. Acho que a informação deveria ser encarada como alimentação, necessidade básica para as pessoas. É muito difícil exercer a cidadania sem informação, não tem jeito.
Aline Mil
Lyvia Lemos
Rodrigo Vilela

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